Bruna querida bruna,

Correspondência

24.04.13

Leia a carta anterior.

Bruna querida Bruna

(Gabriel Fernandes/Creative Commons)

 

Olá, blz? Devo me esconder do Facebook, ele sempre me liga e fica desenrolando seu novelo de excentricidades. O hábito me puxa pra lá. Melhor não. Hoje marcamos encontro às 10:49 na estação Sumaré do Metrô. Combinamos de correr no entorno. Pegar uns descaminhos e sacudir o esqueleto, já que os inferninhos ficaram impraticáveis para nossa saúde. Farei o possível pra chegar na hora, mas ainda estou aqui, parado, na Consolação, em frente ao Riviera, esperando o sinal fechar para atravessar e pegar o metrô. De repente vem um andino e cola. Achei que já o conhecia de algum lugar quando ele disse: “Moça, eu já escapei de ser atropelado sete vezes.” Isso foi fatal. Reconheci o cara. Era o mesmo que te abordara dias atrás. Disse a ele: “Caro andino, vai chupar uma lhama”. E mais não disse. Gosto tanto de suas cartas que quero reproduzi-las todas. Quero entrar na rua H deitado e flutuar por aquela viela com gosto de açaí.

As palavras, essas riquezas, sempre nos transtornam. Maior prêmio na vida é poder sobreviver com elas. Mas elas nos tiram do rumo e minha direção é a estação Sumaré do Metrô. Às 10:49 começaremos a correr. Para suar o que já não faz mais sentido, dissolver o que já era. E, quem sabe, levitar sobre a Paulista, dançar por entre sobre os jazigos do Cemitério do Araçá.

Eram 10:11 quando atravessei a Consolação. Não sem antes olhar para todos os lados. Quase como o andino, fui atropelado na Paulista uma vez que valeu por sete. Em 77. Uma Brasília me pegou em cheio. Flutuei pela avenida e na outra pista, caí de boca. Perdi os dentes que mais gostava.

Mas como o tempo ruge como um mastim nervoso, atravesso a Consola num pé só, feliz porque vou te ver. Quem sabe lá te dar a mão pra ver o Sol. Colibris piarão em uníssono uma sinfonia de Brahms. Louva-Deuses se ajoelharão ante nossa passagem triunfal por entre a aleia de lanterninhas chinesas. Tartarugas interromperão seu coito matinal para nos saudar. Mas agora o tempo ruge como um mastim hidrófobo.

10:32 o metrô engarrafa. Segundo somos informados, há boi na linha. Não acredito. Imagino você já aquecendo, colocando o polegar do pé esquerdo sobre o pescoço e olhando a paisagem do Sumaré com um olho e com o outro aferindo o relógio. Não, não era nosso primeiro encontro. Desde que te conhecera naquele boteco sórdido em Paraty, quando você saiu do fundo daquele pequeno café pequeno, sob a zoada de velhos lobos do mar, com seus óculos de aros de borboleta e lentes de fundo de garrafa. Depois de então, mais dois ou três encontros como aquele em que falamos no Quitandinha, junto, creio eu, com Botika, Vitor Paiva, Domingos Guimaraens, Pedro Rocha e Ericson Pires. Fomos numa van. Não em vão. Combinamos de nos ver depois. Mas depois foi só no Oi Futuro, ano passado, onde você de boné de marinheiro imperava.

Mas agora é certo. Estação Sumaré do Metrô irá ver nosso reencontro. O metrô para na Estação das Clínicas. Entra o Luiz Fernando e pede a carta. Eu terei que entregar. O prazo se esvai. Fico ali sem saber o que fazer. Sim, eu devo entregar a última carta. O prazo do Instituto Moreira Salles me pegou de calça curta. E você me esperando na estação seguinte.

Bem, para que não me recriminem por falta de palavra e juízo, entrego aqui a última carta para o IMS. Mas nós, Bruna querida Bruna, teremos a vida inteira para correr lado a lado pelas aleias de jambos e bambus do Sumaré. Como cantava Master Júlio Barroso: “Nossa onda de amor não há quem corte!”.

Até jah!

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