Dominguinhos, o herdeiro

Música

24.07.13

Assista ao vídeo em que Marcelo Caldi homenageia Dominguinhos.

 

Dominguinhos, morto neste 23 de julho aos 72 anos, é o maior herdeiro musical de Luiz Gonzaga. O primeiro encontro dos dois foi em 1957, quando o Rei do Baião incumbiu ao menino, com então 16 anos, a importante tarefa de dar continuidade à história da música de origem nordestina, a região mais rica do país em termos de cultura popular.

José Domingos de Morais teve um início de vida muito semelhante ao de seu mestre. Nasceu em uma família pobre no sertão de Pernambuco e o pai, Mestre Chico, também era afinador e tocador de sanfona de oito baixos, a famosa pé-de-bode, tal qual Seu Januário, pai de Gonzagão. A formação musical foi totalmente intuitiva.

A paixão pela sanfona lhe abriu definitivamente as portas para a vida musical. Como boa parte dos nordestinos, tentou a sorte no Sudeste com a família e foi pedir ajuda ao velho Lua no Rio de Janeiro. Recebeu então uma sanfona nova e foi agraciado com a possibilidade de tocar e gravar ao lado de seu ídolo, que propôs até a mudança de seu nome. Até então era conhecido pelo apelido de Neném, que Gonzaga não gostava, passando a chamá-lo de Dominguinhos.

Instrumentista, cantor e compositor, Dominguinhos é um dos maiores músicos do Brasil. Sua música traduz e perpetua tudo aquilo que herdou, de maneira simples e natural, sempre com o olhar no presente. Seu toque incorpora elementos contemporâneos à música nordestina. Abraçou a bossa nova e, principalmente, o jazz, daí a facilidade que sempre teve em usar harmonias mais rebuscadas e ousadas em suas canções.

A experiência ao lado de Gonzaga e em tantas viagens pelo país, nos regionais de choro das rádios, nos trios de forró e nas boates do Rio de Janeiro, lhe deu uma bagagem fora do comum. Numa mesma noite era possível que tivesse que tocar bolero, jazz e até cantar músicas que estavam na moda no final dos anos 1960, como as canções de Roberto Carlos.

Dotado da mais alta criatividade, conheceu todos os melindres do resfolego e improvisava como queria, tecendo as melodias mais simples ou dedilhando no mais alto grau de virtuosismo. A versatilidade é a maior característica de suas canções – baiões, forrós, xotes, quadrilhas, frevos, maracatus, choros, valsas, sambas, bossas e outros ritmos.

São mais de 40 discos seus gravados ao longo de mais de 50 anos de música e uma infinidade de participações em discos de artistas de todo o Brasil, incluindo as novíssimas gerações, sempre pondo toda a sua sensibilidade à mostra. Como artista, encantou a todos e ganhou respeito entre os maiores ícones da MPB, principalmente após se tornar parceiro de Gilberto Gil, Chico Buarque e Djavan.

Dominguinhos é um dos sanfoneiros que mais me influenciaram. E claro, se hoje temos uma grande quantidade de sanfoneiros tocando pelo Brasil, ele é o grande responsável. Sua história é a de um homem simples que lutou para vencer as grandes dificuldades que a vida lhe impôs. Hoje, os mais respeitados acordeonistas do mundo o conhecem e o admiram.

Dominguinhos honrou o legado ao ser um discípulo dedicado. Hoje é um mestre, um grande exemplo para as futuras gerações.

Marcelo Caldi é acordeonista, pianista e compositor.

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