Redescobrir Pixinguinha

Música

05.05.12

O show “Pixinguinha: inéditas e redescobertas”, apresentado no IMS-RJ e na Virada Cultural de São Paulo, merece espaço nas antologias da MPB.

O evento marcou o lançamento do livro homônimo organizado por Bia Paes Leme e Pedro Aragão, publicação conjunta do IMS e da Imprensa Oficial, que traz vinte partituras de Pixinguinha. Nove nunca tinham sido tocadas, perdidas que estavam em seu acervo. Outras onze foram executadas ocasionalmente em programas de rádio nos anos 1940 e 1950, mas seguiam inacessíveis desde então.

Para o show, parte das músicas do livro foi selecionada pelos pianistas Benjamim Taubkin, Leandro Braga e Cristóvão Bastos. Cada um executa quatro, seguida de uma última do repertorio clássico de Pixinguinha, como Lamento ou Carinhoso.

São choros e valsas de nomes singelos, como Miúdo, Quebra Cabeças, Procura que achas ou Inês. Os temas e melodias são novos para o ouvinte de hoje, mas a sonoridade é familiar como o reencontro com um velho amigo.

O destaque do show são as interpretações. Os músicos mostram um Pixinguinha particular, afeito ao universo de cada instrumentista, sem deixar de trazer as marcas que todos conhecem.

Benjamin Taubkin dá um acento jazzístico às composições. Encurvado e contrito, com jeitão de Keith Jarret, busca os temas no piano deixando à mostra os rastros da procura: as linhas melódicas aparecem, mas o processo de buscá-las faz igualmente parte da interpretação, marcada ainda por uma leveza no toque que por vezes apenas insinua os acordes.

Leandro Braga é um espanto. Confere às composições uma identidade gaiata e por vezes percussiva. Transforma alguns dos temas de Pixinguinha em misturas agitadas de ragtime e foxtrote. Tem a agilidade e o punch de um virtuose, mas ataca o teclado como quem brinca no quintal de casa.

Cristóvão Bastos, o último a se apresentar, é só precisão e limpeza. Toca com uma economia de recursos que faz o piano soar como um verso de João Cabral de Melo Neto. Os toques secos e a ausência de esforço em sua interpretação contrastam radicalmente com o estilo de Taubkin. E mesmo assim sua contenção não impede uma sonoridade quente e lírica, como fica evidente em sua interpretação memorável de Carinhoso, que encerra o show.

É incrível que um compositor do porte de Pixinguinha ainda tenha tanto a revelar de seu baú: há 194 composições de sua autoria catalogadas pela Enciclopédia de Música Brasileira, mas elas podem ser mais de mil.

Um show como esse não é só um registro da qualidade dos intérpretes e da centralidade do compositor na música brasileira. É também um atestado da vitalidade de um repertório ao mesmo tempo clássico e em pleno processo de transformação.

Na imagem que ilustra o post: o pianista Benjamin executa peça de Pixinguinha em show desta semana.

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