Escrever sem escrever – quatro perguntas a Mario Bellatin

Quatro perguntas

19.04.12

O prolífico autor mexicano Mario Bellatin é conhecido como um expoente da ficção experimental na América Latina. No Brasil, o escritor vem recebendo destaque desde a publicação de Flores (CosacNaify, 2008) e a participação na Festa Literária Internacional de Paraty.  Recentemente, a CosacNaify publicou Cães Heróis, uma estranha e fragmentada narrativa acerca de um homem imóvel que treina trinta pastores belgas malinois. O autor esteve, no mês de abril, da Bienal do Livro e da Leitura de Brasília. Em entrevista exclusiva, Bellatin respondeu a quatro perguntas do Blog do IMS.

Vários livros seus, como Jacobo el mutante, e Los fantasmas del masajista, utilizam recursos fotográficos. Essa espécie de romance híbrido pode sinalizar que apenas as palavras não são mais suficientes para abarcar a realidade contemporânea?

Já faz algum tempo que a ideia de escrever sem escrever me persegue. Uma ideia que não consigo resolver completamente, mas que tem a ver com o fato de que as palavras com que se costuma escrever não conseguem expressar o que não se pode dizer. Para dizer sem dizer, que acredito ser um dos elementos constitutivos da literatura.

Ainda que você seja um escritor prolífico, a maioria de seus romances são bastante curtos. Você planeja algum dia escrever um livro mais longo, ou a brevidade é uma marca pessoal que você não quer abandonar?

Apareceram até agora desse jeito. Acho que tem a ver com uma relação não completamente resolvida com a linguagem do cinema, com a maneira que é realizada a montagem nessa arte. Mas, precisamente no mês de maio, aparecerá um texto longo: El libro uruguayo de los muertos, que alcançará, imagino, as quatrocentas páginas impressas. Até agora, eu pensava que fazia romances em miniatura. Para fazer este último livro, recorri à segunda pessoa. Está escrito em uma chave epistolar.

O romance Cães heróis acaba de ser lançado no Brasil, e os cães da raça pastor belga malinois são muito importantes na narrativa. Li que você é um aficionado por cães. Por que você escolheu essa raça em específico para a narrativa?

Porque existia, na época em que me aproximei deles, o mito de que eram descendentes diretos do lobo. Que o homem não os tinha manipulado, como acontece com outras raças que acabam gerando animais problemáticos, e por isso a lealdade, a valentia e a inteligência eram conservadas em um estado mais puro.

Cães heróis parece conduzir o leitor para que este leia o romance como uma metáfora acerca das ditaduras latino-americanas. Você acha que há algum risco de isso reduzir as possibilidades de interpretação do romance?

Justamente o fato de você me fazer uma pergunta dessa natureza demonstra que acontece o oposto. A frase – que não fala de ditaduras, mas sim do futuro, “Chega de romances de ditaduras latino-americanas” – abre diversas possibilidades de leitura. Escutei dezenas de comentários acerca de qual elemento do livro é o que sustenta uma ideia semelhante, e devo admitir que a maioria dessas interpretações é mais interessante do que o livro em si.

* Na imagem que ilustra esse post: o autor mexicano Mario Bellatin (Basso Cannarsa/CosacNaify – divulgação)

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