Colunistas

Terceira parábola

Bernardo Carvalho

30.09.15

Que lógica é essa que aplaude os lançamentos sucessivos de novos modelos de telefone totalmente dispensáveis, enquanto países de todo o mundo dizem estar fazendo o impossível para manter em 2 graus centígrados a projeção de aquecimento global? O que passa pela cabeça de quem corre à loja do fabricante de telefones, ávido pelo novo modelo, e ao mesmo tempo diz zelar pela salvação do planeta?

O tudo e o todo na filosofia hoje

Carla Rodrigues

23.09.15

Ser filósofa hoje é reconhecer a impossibilidade de falar do tudo e do todo, é fazer desse reconhecimento o motor de um pensamento cuja tarefa passa a ser sair da impotência para o impossível. Nessa estranha conjunção, talvez o filósofo de hoje possa se reencontrar com algum sentido que não seja mais nem o do tudo, nem o do todo, e assim se reconciliar com as ambições mais simples e por isso mesmo, mais ousadas.

A lei do mercado

Bernardo Carvalho

15.09.15

O cineasta português Miguel Gomes concebeu As Mil e Uma Noites, dividido em três "volumes", com base em histórias e personagens reais, se apropriando da estrutura narrativa do clássico para contar o presente. Os contos se passam em aldeias e periferias portuguesas, falando de gente que não tem trabalho nem o que comer. É um filme estranho, híbrido, excessivo, irregular, às vezes engraçadíssimo, às vezes triste, às vezes longo demais. Mas é a melhor resposta à crise e aos lugares-comuns disfarçados de bom senso.

Butler e a violência ética: de quem é a vida afinal?

Carla Rodrigues

09.09.15

Judith Butler critica as duas correntes historicamente opostas na filosofia moral - liberais e comunitaristas - rejeitando, ao mesmo tempo, a exigência de um sujeito estabelecido como senhor de si mesmo para fundamentar decisões éticas e criticando a exigência desta identidade comum como condição para o reconhecimento ético. Assim, rechaça o niilismo e se abre à possibilidade de inventar algo novo e livre de enquadramentos.

Europa

Bernardo Carvalho

02.09.15

Eastern Boys (2013), de Robin Campillo, é um filme de um autor disposto a se embrenhar em uma zona radical de desconforto, de onde não se sai ileso. Aqui a experiência do desejo (a possibilidade do encontro e do reconhecimento, como iguais, entre duas pessoas de mundos completamente diferentes e em princípio incompatíveis) acaba reconfigurando os papéis e a própria ideia de família e de integridade, possibilitando a integração e a convivência com o outro. 

A tal da governabilidade

Carla Rodrigues

26.08.15

A bancada religiosa, ecumênica quando se trata de barrar os avanços na pauta moral, vem crescendo desde a Constituinte de 1988 e responde à expansão da presença das denominações religiosas neopentecostais na sociedade brasileira. A ascensão do conservadorismo é resultado da necessidade de construir uma base aliada no Congresso que sistematicamente exige em troca o bloqueio de iniciativas como a descriminalização do aborto e a criminalização da homofobia. 

O Brasil acabou?

Bernardo Carvalho

19.08.15

A solução de Oswald de Andrade é um slogan imperativo e publicitário: “Somos todos antropófagos”. Somos? O que nos une é devorar a cultura alheia e degluti-la em formas renovadas e revigoradas, locais. Isso num país de analfabetos. É brilhante, mas não faz sentido. É uma frase de efeito que vingou a ponto de continuar sendo repetida até hoje, como um coringa, sempre que é preciso atribuir alguma graça e inteligência ao artifício da identidade nacional.

Uber, primo do Airbnb, neto do Napster  

Carla Rodrigues

12.08.15

Não, a rede não é como você usa, por que isso supõe um livre-arbítrio do usuário que não existe; não, a rede não é neutra, é um ambiente politicamente controlado; não, a rede não é espaço de economia criativa, porque por trás destes negócios estão grandes corporações que migraram sua fonte de lucro da velha para a nova economia. 

Cães

Bernardo Carvalho

05.08.15

Tentei abrir a boca do cão e tirar de lá de dentro o bicho que já não gritava nem se mexia. Em vão. Desci pro meu quarto com a culpa de ter matado o pássaro – ou pelo menos de ter criado as condições de possibilidade para que isso acontecesse.

Receber e reconhecer Judith Butler no Brasil

Carla Rodrigues

29.07.15

Durante mais de 10 anos, Problemas de gênero foi o único título em português de Judith Butler, que desembarca no Brasil no começo de setembro para participar de um congresso acadêmico na UFBA. A vinda da filósofa ao Brasil pode ser uma chance de desfazer leituras equivocadas, como a que reduz seu pensamento à crítica ao binarismo de gênero, sem tomar como político os termos em que a questão se coloca.