Colunistas

Visibilidade

Bernardo Carvalho

09.12.15

No documentário Chico - Artista Brasileiro, de Miguel Faria Jr., o compositor afirma que a Bossa Nova era uma música de elite, dificilmente poderia ser criada hoje. De elite, claro, mas também de exceção. Por que a exceção não cabe nesse mundo onde tanto se alardeia que tudo cabe e que tudo pode afinal existir e ser visto? Por que ela é imediatamente desautorizada?

Do medo ao pânico moral, da segurança ao desamparo

Carla Rodrigues

02.12.15

O medo do que ainda poderá acontecer torna-se o principal mobilizador da política – nacional e internacional – e justifica desde a cassação de liberdades individuais até bombardeios. Esse medo tem sido, seguindo o diagnóstico do filósofo Vladimir Safatle em seu recém-lançado O circuito dos afetos, o principal afeto da política desde o início da modernidade.

Melancolia da falta de respostas

Bernardo Carvalho

25.11.15

Federico García Lorca dizia que sua peça O Público era irrepresentável. Nem por isso deixaram de contradizê-lo e de representá-la. Para além do gosto do desafio, há a explicação do cânone. Lorca é um dos maiores dramaturgos espanhóis do século vinte, um autor incontornável, e O Público, um texto tão radical quanto ambíguo, paradoxal e enigmático, a primeira peça na qual o poeta trata abertamente da homossexualidade.

Enlutar-se, fazer luta do luto

Carla Rodrigues

16.11.15

Somos um país sem nenhuma tradição de luto público ou político. As bandeiras não descem a meio pau quando dezenas de vidas são perdidas em Minas Gerais. Homenageamos nossos mortos à moda mais provinciana, falando bem de quem morreu como se fosse pecado dizer a verdade sobre eles. É tão triste a nossa incapacidade de reconhecer vidas perdidas dignas de serem lamentadas que podemos acabar metidos em debates estéreis como o que invadiu as redes sociais depois dos atentados em Paris. Estabeleceu-se uma disputa entre quais mortes teriam mais valor e quais manifestações de luto seriam mais legítimas. Falta enlutar publicamente os mortos de Mariana porque falta luto público para todos os nossos mortos.

Deus não sabe rir de si

Bernardo Carvalho

11.11.15

O que o perverso está dizendo é que ele está mais próximo de Deus do que dos homens, a verdade está com ele, pois só obedece aos seus instintos. Acontece que, como na lei de Deus, também há uma contradição de base na lei dos instintos e é essa contradição que a obra de Sade escancara, de modo a tornar-se trágica: se o meu instinto diz que devo seguir meu prazer para além de todos os limites, até o assassinato, por exemplo, também tenho que pressupor que os outros ao meu redor, seguindo seus próprios instintos, também poderão me matar por prazer. 

Sobre a plasticidade do machismo na cultura brasileira

Carla Rodrigues

03.11.15

Mulheres de todas as idades, matizes ideológicos, autodeclaradas feministas ou não, mulheres suprapartidárias, magras, gordas, brancas, negras, hetero ou homossexuais estão nas ruas gritando e protestando, marcando uma nova onda do feminismo em um Brasil ainda machista.

Neopopulismo

Bernardo Carvalho

28.10.15

Nesse novo populismo impulsionado pela internet, a naturalidade do lugar-comum subjuga o pensamento crítico, sob a batuta de oportunistas que se fazem passar por justiceiros e representantes da voz e do gosto do leitor contra a arbitrariedade das exceções, contra o elitismo de supostas igrejas, contra tudo o que sai da linha e parece incompreensível, demasiado irregular, estranho ou extraordinário. O resultado é menos democrático do que parece.

Menos quem não é

Carla Rodrigues

20.10.15

A polêmica sobre a campanha Eu também sou imigrante do Ministério da Justiça mostra como racismo rima com xenofobia na violenta cultura brasileira. O problema se agrava quando se encontram o jovem negro imigrante, alvo de racismo e xenofobia, com o jovem negro pobre, vítima de racismo, discriminação e violência policial, bisneto do passado escravocrata cujas feridas sociais ainda não foram curadas. 

Encontro com um editor de direita

Bernardo Carvalho

14.10.15

Acho que era Kant quem dizia que ninguém pensa sozinho. E o que acontece quando a burrice passa a imperar? Alguém dirá que a burrice sempre imperou. Prefiro achar que nem sempre. Até muito recentemente, muito da nossa burrice coletiva se mantinha circunscrita ao isolamento da esfera privada. Ou pelo menos ainda não tinha encontrado os canais públicos para alardear sua hegemonia.

A morte e a morte da esperança equilibrista

Carla Rodrigues

07.10.15

Há uma compreensão política de que o fim das grandes lideranças carismáticas acontece no mesmo momento que em se encerram também as possibilidades das grandes narrativas. Nesse aspecto, Betinho é ao mesmo tempo o último líder carismático e o primeiro a perceber e propor, revestida de campanha contra a fome, uma participação popular direta que eliminava intermediários e representantes.