Na edição abaixo, todas as vidas de Woody Allen em seus últimos filmes:
Eu amo Woody Allen.
Essa confissão se faz necessária para que o ilustre leitor saiba que o tipo faceiro que vos digita é uma zebra. Pois gostar hoje de Woody Allen tornou-se uma espécie de atestado de burrice, de miopia cult. Falta de noção.
No sábado fui ver Meia-noite em Paris disfarçado – sei lá, poderia encontrar um escritor indie, um editor trendy ou um crítico deleuziano e ter minha reputação destruída. No cinema lotado não havia nenhum destes tipos do fabulário intelectual, o que explica em parte o enxovalhamento que Allen sofre nestas latitudes: virou cineasta de muitos e uma das regras de ouro da distinção é estar sempre entre poucos, de preferência renovando o desdém por algo consumido em larga escala, da marca de roupa ao artista premiado.
No filme, o escritor que é sempre Allen vai a Paris de 2010 buscando a de 1920. E a encontra numa brecha espaço-temporal onde submete seus originais a Gertrude Stein, desabafa com Salvador Dalí e pega uma das mulheres de Picasso. Para ele, o melhor é sempre o que passou. Para os que fazem boquinha de nojo para Allen, também. Gostam do “primeiro” Allen e não das “bobagens” que ele produz anualmente. Gostam quando ele se parece com Bergman e desprezam-no quando ele se parece consigo mesmo. Nessa lógica lombrosiana, cenho franzido é sinal exterior de inteligência.
Como todo artista prolífico e obsessivo, Allen se repete. Nelson Rodrigues também se repetia, escreveu demais e sempre sobre as mesmas coisas. Nem por isso um e outro perderam o prazo de validade enquanto produziam. Num exercício de ociosidade intelectual, fico aqui imaginando o que seria um Woody Allen não repetitivo, mas variado ou experimental: certamente seria uma outra coisa. Mas não Woody Allen. E não necessariamente melhor. A cada ano, tenho certeza que prefiro um Woody Allen igual (e, claro, ruim) a um David Lynch diferente (e, óbvio, genial).
Os Estados Unidos, com exceção da República de Nova York, não gostam mais de Woody Allen – casar e ter filhos com a enteada foi demais para o país do Tea Party. O Brasil pensante também o rejeita pela mentalidade clubista que é patrimônio nacional. Num e noutro caso, melhor para ele. E para nós, claro, os menos inteligentes que não se importam com mais do mesmo – desde que o mesmo seja esse.
P.S – A sessão de Meia-noite em Paris a que assisti terminou com aplausos do público. Um aplauso sem dúvida burro, de gente bestificada.