Uma tarde em espanhol

IMS na Flip

04.07.15

Na sexta-feira, o clima permaneceu nublado em Paraty, e a casa do IMS permaneceu lotada de leitores que vieram assistir às mesas com convidados da programação oficial falando de seus livros favoritos.

Antes, às 11h30, houve a exibição de O turista aprendiz revisitado, filme de Maureen Bisilliat recompondo a jornada de Mário de Andrade em O turista aprendiz.

Diego Vecchio conversou com Antônio Xerxenesky sobre a obra mais estranha de Flaubert

O primeiro convidado foi o argentino radicado na França Diego Vecchio, que veio à Festa Literária por ocasião do lançamento de seu romance Micróbios. Vecchio escolheu falar sobre Bouvard e Pécuchet, livro que Flaubert deixou inconcluso e que o autor argentino disse considerar o seu melhor. Diferente da sua obra realista e séria, Bouvard e Pécuchet se destaca pelo cômico. Em conversa com Antônio Xerxenesky (clique aqui para escutar), Vecchio o define como um “romance contra os romances”, uma obra do século XIX que parece contrariar todo o estilo da época. Além disso, Flaubert parece questionar todo o positivismo imperante nas ciências do século XIX. Como Vecchio explica: “É um livro que usa os saberes, o conhecimento, para questionar a lógica da ordem e do progresso”. E foi esta maneira de fazer literatura que marcou Vecchio e está impresso em seu Micróbios. Uma coisa é certa: se parte do público ainda não tinha lido este último romance de Flaubert, com certeza se sentiram instigados a comprar um exemplar ao sair da Casa do IMS.

Casa cheia para assistir à fala de Leonardo Padura. A mediação foi de Marília Scalzo

O segundo convidado foi o cubano Leonardo Padura, que falou sobre como foi transformar pessoas que de fato existiram em personagens de ficção em O homem que amava os cachorros (clique aqui para escutar). Para Padura, “é suicídio tentar reproduzir como uma pessoa realmente é num romance”, e foi pensando no que funcionaria literariamente que deu vida a Trótski e Ramón Mercader. “Há uma quantidade enorme de informações que a pessoa pode pegar, a dificuldade era a de conseguir uma síntese. É uma tarefa muito diferente da de um biógrafo. Eu precisava dar o caráter do personagem. Entrar em sua intimidade e revelá-lo a partir do interior. Essa foi a grande dificuldade do romance”, disse o autor cubano. Padura ainda contou da vez em que encontrou o ex-presidente Lula, que leu o livro por indicação de Dilma e comentou que a figura de Trótski era tão carismática que foi se “tornando trotskista conforme a leitura”. No decorrer da fala, Padura encantou o público com anedotas sobre o intelectual marxista e sua paixão por Frida Kahlo.

Beatriz Sarlo e Samuel Titan Jr. em uma conversa entusiasmante repleta de anedotas pessoais

Às 18h, a grande crítica literária Beatriz Sarlo conversou com Samuel Titan Jr. acerca de sua própria obra (clique aqui para escutar), começando pelo seu livro de viagens pela América Latina durante o período de efervescência política nos anos 1960. Ela contou do seu deslumbramento inicial (dela e de todos os argentinos) por Niemeyer e a cidade de Brasília, que parecia, na ingenuidade da época, o ápice do modernismo estético e econômico brasileiro. O livro de viagens serve como uma espécie de romance de formação, “o húmus onde se desenvolveu minha ideologia”, contou Sarlo.

Mencionando Roland Barthes como seu mestre, a crítica citou o teórico francês ao dizer que só escrevia sob encomenda. Sua experiência no jornalismo como colunista dominical que não podia só ficar falando de Borges e Barthes a levou a escrever sobre assuntos mais mundanos, e assim começou o seu interesse pelas cidades. Quando perguntada por Samuel Titan sobre sua relação com a literatura brasileira, Sarlo contou sobre a frustração de tentar ler Macunaíma em português. Embora ela saiba ler jornais e críticas na nossa língua, o estilo de Mário de Andrade se revelou impenetrável para uma crítica argentina que não fala a língua, pois há muitas marcas de oralidade.

Da esquerda para a direita: João Bandeira, Michel Favre, Fabiana de Barros e Heloisa Espada

Encerrando as atividades do dia, a Casa do IMS sediou uma mesa em parceria com o SESC acerca do artista Geraldo de Barros, com presença da filha dele, Fabiana de Barros, além de João Bandeira, Michel Favre e Heloisa Espada, curadora da exposição Geraldo de Barros e a fotografia.

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