O boxeador, um instante antes do nocaute
José Carlos Avellar
19.05.15
O desemprego é questão central em A lei do mercado, filme de Stéphane Brizé que acaba de estrear em Cannes. O filme joga com um duplo significado para seu título. Na primeira parte, refere-se "aos mecanismos de enriquecimento de nossa sociedade". Na segunda parte, ao novo emprego do protagonista: seu trabalho num supermercado consiste em vigiar clientes e os demais empregados e aplicar a lei do mercado aos infratores.
F for Fake (ou for Film?)
José Carlos Avellar
18.05.15
Dois filmes em Cannes estabelecem um curioso diálogo: Carol, de Todd Haynes, e Mia madre, de Nanni Moretti. Em Carol, o diretor procura ser verdadeiro por meio de uma imagem fake. A certa altura de Mia madre, um personagem grita que no cinema é tudo fake, que é um ator mas não suporta mais viver num espaço falso, quer ser levado de volta à realidade.
A real dimensão do pequeno, o pequeno alcance do muito grande
José Carlos Avellar
17.05.15
José Carlos Avellar continua a sua cobertura do festival de Cannes, desta vez comentando os filmes de Gus van Sant, The sea of trees, e de Philippe Garrel, L'ombre des femmes. O primeiro é uma narração mais perto da tradição formada nas ideias de alta definição e de alto espetáculo. O segundo está mais próximo de um gesto essencialmente cinematográfico, embora de aparência simples, despretensiosa, de um relato cotidiano.
Duas (suaves) doçuras do Japão
José Carlos Avellar
15.05.15
Acompanhando em Cannes o mais importante dos festivais de cinema, José Carlos Avellar comenta o polêmico e violento filme de abertura, Cabeça erguida, de Emmanuelle Bercot, sobre raiva adolescente, e dois filmes japoneses, os novos de Kore-eda e Kawase, cuja doçura contrasta com a violência do longa francês.
O artista e seu modelo
José Carlos Avellar
11.05.15
Um tema constante na obra de Picasso, espécie de reflexão sobre o processo criativo formulada em séries de desenhos, gravuras e pinturas – O artista e seu modelo –, talvez seja o verdadeiro assunto das Últimas conversas filmadas por Eduardo Coutinho: a busca da possível (ou impossível?) realização de uma imagem capaz de retratar o modelo e também o artista.
Tião, amanhã
José Carlos Avellar
16.04.15
Abril de 1981: nos cinemas, lado a lado, Eu te amo, filme recém concluído, e Iracema, uma transa amazônica, realizado sete anos antes, mas só então liberado pela censura. Desse encontro não planejado entre Paulo, o industrial de Arnaldo Jabor, e Tião, o caminhoneiro de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, resulta algo entre uma conversa ao telefone, uma conversa de botequim e um monólogo interior: num presente suspenso no tempo, o passado fala com o futuro.
Adaptando a confusão
Antônio Xerxenesky
31.03.15
Vício inerente, novo filme de P.T. Anderson, é a primeira adaptação do cultuado escritor norte-americano Thomas Pynchon para o cinema. Os acertos e erros do longa se devem muito à fidelidade ao material. Se, por um lado, é bem-sucedido em transmitir a confusão da trama e em captar o humor absurdo de Pynchon, por outro, revela-se cansativo na última parte.
Tema: decadência humana
Barbara Rangel
16.03.15
Grey Gardens é um dos principais documentários de Albert Maysles, morto em 5 de março. O filme, que será lançado em DVD este ano pelo IMS, retrata um ambiente degradado, com mãe e filha dividindo uma velha casa. Maysles trabalhava como psicólogo antes de se tornar câmera e diretor de documentários. Ainda que Grey Gardens tenha sido realizado em conjunto com outras três pessoas, é difícil deixar de pensar que a sensibilidade com a qual Big Edie e Little Edie foram retratadas deve muito a ele.
A natureza não-indiferente
José Carlos Avellar
03.02.15
Se observamos apenas a história narrada de O segredo das águas, novo filme da japonesa Naomi Kawase que entra em cartaz esta semana no IMS, vemos como dois adolescentes aprendem a viver no mundo adulto. A história tem algo de um tradicional romance de formação. Mas, se observamos também o modo de narrar, o filme se revela mais próximo de um ensaio cinematográfico – um ensaio sobre (como queria Eisenstein) a natureza não-indiferente.
Estética da fome: 50 anos
José Carlos Avellar
26.01.15
O ensaio "Estética da fome", no qual Glauber Rocha prega que os países subdesenvolvidos construam sua força a partir de suas fragilidades, está completando 50 anos. Segundo ele, deve-se criar uma cultura da fome, pois esta é a nossa originalidade. E isto não se dá de forma pacífica. "Uma estética da violência antes de ser primitiva é revolucionária, eis aí o ponto inicial para que o colonizador compreenda, pelo horror, a força da cultura que ele explora."