Uma certa soberba da ignorância costuma exalar dos comentários, entre nós, sobre aqueles vencedores do Nobel de Literatura que escapam às listas dos eternos candidatos. Mo Yan, chinês que foi anunciado nesta quinta como premiado de 2012, é, por aqui, candidato forte ao epíteto de “desconhecido”. Acha-se que o problema é da Academia Sueca, sem dúvida idiossincrática como qualquer júri literário. Mas bem que pode ser nosso, de uma certa preguiça de descobrir o mundo literário pelos próprio olhos, esperando que outros o façam por nós.
Em geral reprova-se no Nobel algo que se define como “critérios políticos” da premiação, argumento que costuma saltar quando o vencedor não é europeu, norte-americano ou, vá lá, latino-americano – premiar um chinês e sua conflituada relação com o governo de seu país fecha com perfeição este raciocínio. O segundo argumento mais cotado vai na linha “a raposa e as uvas”: é discutível a importância do prêmio, que teria esquecido, entre outros, Borges e Jorge Amado, e, nos últimos anos, vem negligenciando um Philip Roth ou um Amós Oz.
Em uma busca rápida, vê-se que Mo Yan, presente na lista de jogatina da Ladbrokes, a casa de apostas inglesa, foi fartamente editado na Alemanha e na França e está disponível em inglês e espanhol também. A Granta, que está começando a editar na China, obviamente já tinha se ocupado de sua obra. Ou seja, mesmo sem ser uma coqueluche global, como Haruki Murakami, o primeirão de muitas listas, Mo Yan é nome consolidado.
Fico me imaginando jornalista alemão, recebendo a notícia, em plena Feira de Frankfurt, de que o Nobel de Literatura é Ariano Suassuna. Antes de digitar “desconhecido” bastaria verificar que, na Amazon, é possível comprar “Der Stein der Reiches”, “A pedra do reino”, e pelo menos saber da existência de “O Auto da Compadecida”, com o quilométrico título “Das Testament des Hundes oder das Spiel von unserer lieben Frau der Mitleidvollen”.
Se é óbvio que um Nobel não significa mais – aliás, nunca significou – a imortalidade de um autor ou seu reconhecimento máximo (Patrick White, 1973, alguém?), trata-se de uma mais do que razoável indicação de leitura. Não nos esqueçamos que, sem o prêmio, provavelmente o Brasil não conheceria, em edições comerciais e bem cuidadas, Wislawa Szymborska (1986) ou Imre Kertész (2002).
Não há rigorosamente nada de aberrante no fato de o Nobel preferir Mo Yan (que nunca li, fato do qual não me envergonho e tampouco me orgulho) a Javier Marías. No fundo é até bom, pois para uma comunidade intelectual ainda impermeável a experimentar novos sabores literários, abre-se uma nova possibilidade. Já que, no fundo, o Nobel para o Brasil só não presta quando não premia quem a gente conhece. E só não é melhor porque ainda não premiou um brasileiro.
* Na imagem que ilustra o post: o escritor Mo Yan.