Sérgio Sant'Anna

Meio de campo

Sérgio Sant'Anna

12.09.11

E o Gerson? O que dizer de seus passes longos, como aquele passe para Pelé matar a bola no peito, deixar cair e fulminar o goleiro da Tchecoslováquia no segundo gol do Brasil na Copa de 70? Poderia falar de tantos outros, até nos que só vi jogar quando criança, como Zizinho e Jair da Rosa Pinto. Enfim, os artistas da bola, hoje tão difíceis de se ver e vou incluir também um estrangeiro que me encantava, Zinedine Zidane. E confesso que sempre me orgulhei de ser amigo de um deles, meio-campista, Afonsinho, irretocável na sua categoria, nos seus passes e também no carregar a bola, e ainda como pessoa humana.

Apreciando a literatura argentina

Sérgio Sant'Anna

05.09.11

O Aleph nos leva a Borges, que não poderia estar ausente do livro de Ricardo Piglia. Na narrativa "O último conto de Borges", ele nos diz que o último conto do mestre surgiu de um sonho em que viu um homem sem rosto num quarto de hotel e que lhe oferecia nada menos que a memória de Shakespeare. Afirma ainda Piglia que Borges teve de resolver o dilema: como escrever num espanhol que tenha a precisão do inglês, mas conservando os tons da fala nacional. Tudo isso a propósito da estranheza dos dois grandes estilos produzidos, segundo Piglia, no romance argentino do século 20: o de Macedonio Fernández e o de Roberto Arlt.

De falsificações e falsificadores

Sérgio Sant'Anna

29.08.11

Mas vale a pena contar um caso. Pelos bares de BH, na década de 70, havia um sujeito apelidado de Makario, que vivia tirando poemas seus do bolso e mostrando às pessoas nos bares, que mal continham a impaciência e achavam os poemas muito ruins. Mas não é que o Makario um dia saiu mostrando um poema de Drummond, dizendo que era seu e todo mundo continuou a detestar. Noutro dia, mostrou um poema seu e disse que era de Drummond e muita gente não só acreditou, como gostou.

Ainda os boleiros e outros tópicos

Sérgio Sant'Anna

22.08.11

Você, com certeza, sabe que o apelido de Heleno era Gilda, por causa da personagem do cinema interpretada por Rita Hayworth, bela, boêmia e temperamental, assim como foi Heleno, só que no masculino. Chegou aos meus ouvidos que uma vez o Heleno, jogando pelo Botafogo contra o Fluminense, em Laranjeiras, depois de ouvir em coro a torcida tricolor gritando "Gilda, Gilda", fez um gesto obsceno para a social do Fluminense. A polícia teve de fazer o possível e o impossível para evitar uma invasão de campo, coisa aliás comum naquela época.

A palavra encenada

Sérgio Sant'Anna

15.08.11

Mas não poderia falar de teatro sem mencionar aquele espetáculo, no meu entender e no de muita gente, o maior de todos já realizado no Brasil, Macunaíma, de Antunes Filho, dirigindo uma adaptação do francês Jacques Thieriot do romance de Mário de Andrade. Aliás, Antunes não negava, entre suas influências, Bob Wilson, assim como Kazuo Ohno e Pina Bausch. Como fiquei amigo do pessoal do grupo do Antunes, fui convidado algumas vezes para ver os bastidores de Macunaíma e de Nelson Rodrigues, o eterno retorno, também do diretor paulista. Esta experiência está narrada no meu conto "O concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro", e também posso dizer que nunca mais fui o mesmo depois dela.

Filmes

Sérgio Sant'Anna

08.08.11

Mas e a minha surpresa, Zé, ao saber que o roteiro havia passado para as mãos de Fernanda Young e seu marido, cujo nome não me lembro, e o filme ia se chamar Bossa nova? Diante de tudo o que eu lia a respeito nos jornais e via na TV, logo entendi que o Bruno ia fazer uma comediazinha romântica com o Antônio Fagundes namorando a Amy Irving. Não participei de pré-estreias, festinhas e outros babados e fiz questão de assistir ao filme sozinho, numa sessão de meio de semana à tarde, praticamente me escondendo na última fileira do cinema, para não correr o risco de ser visto por algum amigo.

Os caminhos da liberdade

Sérgio Sant'Anna

01.08.11

E vou fazer uma confissão. Quando fui demitido da Petrobras por subversão, logo após o Golpe de 64, houve um lado meu que se sentiu aliviado. Como não fui preso ou sofri violências físicas, pensei: agora, quem sabe, vou poder escrever. E, de fato, tendo o meu pai amigos influentes, consegui um emprego na Justiça do Trabalho, de meio horário, tudo o que um aspirante a escritor poderia pedir.

De escritores, livros e viagens

Sérgio Sant'Anna

25.07.11

Dos escritores portenhos, conheço pessoalmente César Aira, que me deu a honra de traduzir meu Um crime delicado para o castelhano. O livro foi publicado pela editora Beatriz Viterbo, uma homenagem à amada do narrador de O Aleph, que você deve conhecer muito bem. Uma das tantas coisas interessantes, para o dizer o mínimo, em O Aleph, é que pode ser lido também como uma história de amor, este conto que toca o infinito. Já de Aira pode-se dizer que é um tanto excêntrico e na Argentina é tido como uma pessoa difícil, que não dá entrevistas aos jornais locais. Mas, por alguma razão, gosta do Brasil e dos brasileiros (...).

Cartas na mão ou no micro

Sérgio Sant'Anna

18.07.11

Minha relação com a tecnologia jamais poderá ter a naturalidade da garotada de hoje. Sou uma das poucas pessoas que não possuem nem mesmo um celular. Eu e o grande escritor Luiz Ruffato. Então, entre tantas coisas boas que nos têm trazido esta nossa correspondência, uma é descobrir que o computador e a internet também servem para uma carta mais detalhada que os lacônicos e-mails. Acho também bacana que escrevamos um para o outro, mas com um olho nos visitantes do site do IMS. E fiquei feliz de receber comentários de terceiros e suponho que você também.

Clássicos para tudo o que é gosto

Sérgio Sant'Anna

11.07.11

Fico até encabulado com os seus elogios a meu livro, em sua carta bonita, leve e solta. Nela você pergunta qual é a minha relação com os clássicos. Não vou dizer que é sempre uma relação fácil, mas os clássicos já me deram momentos de uma incomparável riqueza existencial. Mas confesso que só consegui ler os sete volumes de Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust, na terceira tentativa.