Correspondência

John Marcher ao avesso

João Paulo Cuenca

13.01.12

E o que eu fiz com esses dez anos? O que fizemos? É tempo pra burro, é nada. Acho que eu sofro de uma espécie de johnmarcherismo às avessas, Chico. Se o protagonista do Henry James passa a vida ensimesmado à espera da fera, do mistério, e acaba sem fazer porra nenhuma - nem um trato na pobre da May Bartram -, acho que eu consegui não só descobrir, mas também criar as minhas feras nos últimos anos.

Fala besteirinha!

Aldir Blanc

22.12.11

Acho que todos temos duas iniciações importantes: o primeiro contato com alguma coisa que internamente reconhecemos como trazendo uma emoção diferente de tudo experimentado até aquele momento. A segunda iniciação é o ato sexual propriamente dito, ou melhor, praticado. Minha primeira, no sentido que descrevi, foi muito precoce, dando inteira razão a Freud sobre a malícia das crianças. Despi, no quarto de brincar que ficava nos fundos da casa-paraíso de Vila Isabel, a filha de uma empregada, mais ou menos da mesma idade que eu, uns 7 anos.

Saudosa cabocla

Arthur Dapieve

19.12.11

No final dos anos 60 para os anos 70, porém, não havia muitos lugares onde um guri curioso pudesse contemplar a inteireza da figura feminina. Eu era viciado em banca de jornal e descobri que havia uma exceção nessa burca social: postais com fotos de índias (...). Nos postais, eu podia contemplar as jovens índias peladonas e ainda afetar um precoce interesse antropológico. Uma tia umbandista achava, tolinha, que o meu interesse pelas fotos do Xingu se devia à existência de um caboclo saudoso de sua maloca dentro de mim. Nem eu nem ela imaginávamos que o que eu queria era estar dentro de uma cabocla.

Ver ou não ver, eis a questão

Aldir Blanc

15.12.11

A pedido do meu inesquecível irmão, Marco Aurélio Braga Nery, Monique pousou para a capa do CD 50 anos. Aquela perna linda não é montagem! Foi apoiada no braço de minha poltrona, de sapato vermelho no pezinho! Eu, aparvalhado, estava com lipotimia na referida poltrona. (...) Eu, de copo em punho e cigarrilha, procurava não olhar a Monique com a mínima calcinha exibindo a, digamos, segunda testa a um palmo de meu avantajado nariz! O que um tijucano faz numa hora dessas? Mari conferia tudo com olhos de águia.

Labaredas da carne

Arthur Dapieve

12.12.11

Fiquei muito impressionado com a Bárbara Evans, filha da Monique, nas páginas da Playboy. (...)Não sei se você se lembra, mas no falecido site NoMínimo, eu tive durante doze meses uma coluna intitulada "A Playboy do Dapieve". (...) Anunciava qual era a entrevista, destacava uma ou duas matérias e analisava, com extrema frieza técnica, claro, a churrascaria rodízio que, afinal, é o que nos faz comprar a Playboy. A Bárbara Evans quase me fez bancar uma edição extraordinária e temporã daquela coluna. Sinto, contudo, que as palavras me faltariam, e o texto se resumiria a 735 "arf".

Ilusões perdidas

Aldir Blanc

08.12.11

Desde 1978, quando o Peru se autossodomizou para que a Argentina metesse 6 vezes, tirando o Brasil da disputa pelo título, que prometo parar com a fissura em futebol e ir pescar. (...) Creio que, diante do último brasileirão, do esquema Corinthians e Ricardo Teixeira, devastado pelo grande Tostão, do dedo de Lula na mutreta do estádio em Itaquera, juro que pegarei em meus combalidos caniço e samburá, e pescarei, nem que seja no chafariz da praça Xavier de Brito. Estou absolutamente farto!

Xingar o juiz é o mínimo

Arthur Dapieve

05.12.11

Criou-se, no Brasil, a seguinte ficção: rouba-se em todas as áreas da vida nacional exceto na do futebol. Quer dizer, tem gente que recebe propina em garagem de Brasília, tem gente que manda dinheiro público para conta secreta na Suíça, tem gente que desvia bolsa merenda para comprar bolsa Louis Vuitton, mas, ah, não tem gente que rouba no placar? É preciso tal grau de suspensão da descrença para sustentar um troço desses que o sujeito deveria ser internado por deficiência mental.

Hostes cruzmaltinas

Aldir Blanc

03.12.11

Não estou empolgado (herança paterna: já expliquei em carta anterior) com a última rodada do Brasileirão. Acho que o Vasco cumpriu seu dever. Foi mais longe do que o previsto. Não dá para ficar otimista quando o próprio clube erra na contagem de cartões amarelos de um jogador fundamental, e um jornalista é que revela a mancada.

Síndrome de aeroporto

Arthur Dapieve

28.11.11

É por essas e por outras que eu te disse: não tenho medo de avião, mas de aeroporto. Não há avião que caía eternamente, mas aeroporto pode ser para sempre. Uma espécie de purgatório cheio de engravatados, lepitópis e peruas emperiquitadas, recendendo a pão de queijo (o lugar, não as peruas). Antigamente, devo confessar, eu achava o clima nos aeroportos sensual e romântico, prenhe de sugestões de sexo subsônico e destinos alternativos. Devo ter visto muito ou Emmanuelle ou Casablanca. Hoje, a impressão é de praticar sexo solitário: sempre me ferro. Daí meu medo de aeroporto.

Em matéria de monstro

Aldir Blanc

24.11.11

Antes da esculhambação que darei num (in)certo poder de nossa pátria amada, ficaram faltando dois causos envolvendo aviões: na década de 70, em plena ditadura, João Bosco e eu passávamos pela vistoria de bagagem no aeroporto de Manaus, Zona Franca em todos os sentidos. Eu havia comprado uma pequena filmadora. Durante a revista, apareceu um sujeito grandalhão, de terno, com bigodes de Zapata, e mostrou a carteira de policial: - João Bosco e Aldir Blanc? Amigo, não sei o que o João sentiu. Para mim, foi igual ao momento gelado na coluna quando foi aplicada a morfina, antes de minha cirurgia de fêmur.