Patti lê Pessoa lendo Whitman

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01.10.15

Patti Smith é das vozes mais literárias do rock. A obsessão principal ou mais recorrente é Rimbaud: a exposição que montou em 2008 na Fondation Cartier, em Paris, exibia uma surrada camiseta com a foto do poeta jovem que ela tanto usou em shows e até um cartão de visitas do próprio, arrematado em um leilão.

Na mesma sala, reuniu seixos do leito do rio onde Virginia Woolf se matou e fotos do túmulo de Walt Whitman. Todas estas relíquias literárias, que incluem uma cadeira de Roberto Bolaño, também foram fotografadas por ela em polaroides.

Na semana passada, às vésperas de lançar nos Estados Unidos o M Train, livro de memórias que é uma espécie de continuação do inesperado bestseller Só garotos (lançado no Brasil pela Companhia das Letras com tradução de Alexandre Barbosa de Souza), Patti visitou a Casa Fernando Pessoa, em Lisboa. E gravou sua leitura de partes do quilométrico “Saudação a Walt Whitman”, poema do heterônimo Álvaro de Campos, em tradução para o inglês de Richard Zenith.

A Casa divulgou o vídeo que publicamos agora com os trechos do original abaixo.

(…)

Sei que cantar-te assim não é cantar-te — mas que importa?
Sei que é cantar tudo, mas cantar tudo é cantar-te,
Sei que é cantar-me a mim — mas cantar-me a mim é cantar-te a ti
Sei que dizer que não posso cantar é cantar-te, Walt, ainda…

(…)

Para cantar-te
Para saudar-te
Era preciso escrever aquele poema supremo,
Onde, mais que em todos os outros poemas supremos,
Vivesse, numa síntese completa feita de uma análise sem esquecimentos,
Todo o Universo de coisas, de vidas e de almas,
Todo o Universo de homens, mulheres, crianças,
Todo o Universo de gestos, de actos, de emoções, de pensamentos,
Todo o Universo das coisas que a humanidade faz,
Das coisas que acontecem à humanidade —
Profissões, leis, regimentos, medicinas, o Destino,
Escrito a entrecruzamentos, a intersecções constantes
No papel dinâmico dos Acontecimentos,
No papirus rápido das combinações sociais,
No palimpsesto das emoções renovadas constantemente.

(…)

Para saudar-te
Para saudar-te como se deve saudar-te
Preciso tornar os meus versos corcel,
Preciso tornar os meus versos comboio,
Preciso tornar os meus versos seta,
Preciso tornar os versos pressa,
Preciso tornar os versos nas coisas do mundo
Tudo cantavas, e em ti cantava tudo —
Tolerância magnífica e prostituída
A das tuas sensações de pernas abertas
Para os detalhes e os contornos do sistema do universo.

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