Cosic, o não-Nobel

Literatura

06.10.11

Muita gente não estranhou quando, ao abrir esta manhã o site da Academia Sueca, deu com o nome de Dobrica Cosic como vencedor do Nobel de Literatura de 2011. Afinal, faz parte da caixa-preta do prêmio chamar a atenção para autores fora dos eixos mais convencionais de língua e literatura – também foi estranho um dia topar com Wislawa Szymborska e talvez ainda seja fuçar o site oficial e descobrir que o vencedor de 1979 foi Odysseus Elytis. E que Halldór Kiljan Laxness foi laureado em 1955.

“O Nobel de Literatura de 2011 vai para o escritor sérvio Dobrica Cosic, o último dissidente do século 20, testemunha de uma era em declínio, assim como profeta de uma outra que nasce”, dizia a justificativa do prêmio, para júbilo dos meios de comunicação na Sérvia, que comemoravam a glória de seu filho ilustre, tido como um dos favoritos desse ano.

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Menos de 15 minutos depois, era anunciado em Estocolmo o nome do poeta sueco Tomas Tranströmer, o verdadeiro vencedor e, também ele, apontado como um dos favoritos. Cosic foi “eleito”, isso sim, por um grupo de autodenominados “ativistas” que, num site cujo endereço é confundível com a página oficial do Nobel, reproduziram com precisão o design e a linguagem pomposa dos anúncios oficiais do prêmio.

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A atitude vai além de uma brincadeira de mau gosto – como a que, décadas atrás, vitimou o italiano Alberto Moravia, que chegou a ligar para a imprensa para anunciar a premiação que não houve. Os mestres do fake queriam – e conseguiram – chamar a atenção do mundo para uma candidatura que no seu entender é inaceitável.

“Hoje de novo a Sérvia se volta para a guerra, o terror e o kitsch mortal dos anos 90, a violência contra a diversidade, o conservadorismo nacionalista e a ortodoxia desonesta. Acreditamos que a atividade política de Dobrica Cosic ainda é profundamente entrelaçada com este perigoso sistema de valores, que continua a ameaçar a todos nós”, diz o texto logo substituído na página, que chama a atenção para o fato de Cosic sempre estar “próximo ao mais alto poder político e aos que o exercem”.

“Dobrica Cosic não é o vencedor do Prêmio Nobel, ainda que o público geral na Sérvia e ele próprio tenham acreditado nisso por 15 longos minutos. Esse simples fato nos traz algum consolo”, arrematam os responsáveis pela página.

O ardil é perfeito como protesto e requintadíssimo como vingança pessoal. Através dele, o mundo foi lembrado (ou ficou sabendo, como este que vos digita) da intensa  atividade de Cosic na formulação das teorias nacionalistas sérvias.

Mas, para as vaidades de um escritor cioso de sua imagem e que sempre cortejou o poder, ser desmentido como o Nobel é a humilhação suprema. Na fornalha das vaidades, Cosic foi incinerado em temperatura máxima – e, dificilmente, no fim da vida, voltará a ser cogitado. Um Nobel vale 1,5 milhão de dólares. Mas esse não-Nobel não tem mesmo preço.

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