A reprodução da gritaria
Camila von Holdefer
26.09.18
Com ou sem censura, a discussão que se formou em torno da figura e da obra de Robert Mapplethorpe com a polêmica no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, ao mesmo tempo em que diz algo sobre o presente, faz emergir um episódio do passado. Continuamos a explorar e a mobilizar o pânico e o moralismo, buscando brechas na educação e fissuras na tolerância para dizer o que a arte deve ou pode representar, e de que maneira, e para quem.
O poder da desobediência
Camila von Holdefer
24.07.18
Pode-se concordar ou não com alguns comentários e conclusões de Hannah Gadsby no stand-up Nanette. No entanto, o formato escolhido pela comediante é tanto o ponto de partida quanto a concretização de uma busca mais ampla por liberdade.
Mulheres, sem espanto ou desdém
Camila von Holdefer
19.04.18
Projetos e ações que incentivam a leitura de literatura produzida por mulheres têm sido onipresentes. Alguns pontos, no entanto, podem ser ajustados. Partindo de uma leitura de Siri Hustvedt, Camila von Holdefer discute o que ainda precisa ser feito.
O valor do riso
Camila von Holdefer
26.10.17
Nem sempre é fácil empregar o humor como ferramenta da militância feminista. Fazer rir, e rir de si mesma, tomar para si toda a dimensão do riso, é botar as coisas em seus devidos lugares e as mudanças em marcha. Que alguns homens não vejam graça nenhuma nisso não é problema nosso.
Atividade organizada
Camila von Holdefer
31.07.17
Publicado no segundo semestre de 2015, Strange Tools é o livro mais irregular de Alva Noë. Se falha em apresentar um texto mais rigoroso, porém, a provocação que oferece é bem-vinda. Quando Noë pensa de forma um tanto tortuosa, ainda assim pensa melhor do que a maioria. Em poucas páginas, partindo da natureza humana, o filósofo norte-americano procura explicar a arte e os mecanismos pelos quais ela se transforma continuamente.
Contar uma boa história
Camila von Holdefer
29.05.17
Nada no clamor para que autores voltem a “contar uma boa história” faz sentido. Mesmo a literatura comercial, ainda que sem qualquer engenho e de forma torta e tênue, diz algo sobre si mesma. Quando autores dispostos a experimentar com a literatura de gênero deslocam o foco da resolução para a investigação, não raro o resultado é instigante. Quase todas as experiências revelam a relação complexa, mas estreita, entre investigação e signos, linguagem, literatura.
Algo tão irrelevante quanto a realidade
Camila von Holdefer
15.02.17
As boas intenções, como prova o exemplo de Florence Foster Jenkins, não servem como fator atenuante no caso de um resultado desastroso. Entre a concepção e a realização, e não apenas na criação artística, há um longo caminho a ser percorrido. Com a valorização do discurso fácil que procura recompensar aqueles que, a despeito das dificuldades e das limitações, resolvem perseguir seus sonhos, como se a capacidade de idealização devesse se sobrepor à capacidade de realização, a guinada à brandura é previsível. A condescendência na crítica, porém, não vai nos levar muito longe.
Para compreender o riso
Camila von Holdefer
05.12.16
Se a função social do humor na intimidade responde às iniciativas e às necessidades de quem está inserido naquela relação, na esfera pública tudo é bem diferente. Excluir as mulheres do jogo, que não podem tomar para si a iniciativa de fazer graça e de discutir o cômico, é uma forma de tornar o humor um privilégio de alguns. Pior ainda é perturbar um coletivo de milhões com a tentativa de puxar o riso quando há emoção e há choro. O humor é humano e é social.
Quando tudo desmorona
Camila von Holdefer
10.10.16
"Se você entendeu Elena Ferrante facilmente, você não entendeu nada", afirma Camila von Holdefer em texto sobre Dias de abandono, romance de 2002 da celebrada autora italiana lançado no Brasil neste ano pela Biblioteca Azul, em tradução de Francesca Cricelli. "Vejo em Ferrante alguém brilhante que jogou habilmente o jogo".
A assim chamada realidade
Camila von Holdefer
01.04.16
Em Liquidação, um caso amoroso narrado por uma personagem parece ao protagonista “simples como um conto, e impossível como a vida”. Ler o Nobel de Literatura Imre Kertész (1929-2016) é resolver essa questão principal: afinal, escrever tem algum valor? E a vida? Para nossa surpresa, a resposta é positiva. Para Camus, “o erro de uma certa literatura é acreditar que a vida é trágica porque é miserável”, uma vez que “pode ser emocionante e magnífica, [e] esta é sua tragédia”. Em um certo sentido, a obra de Kertész reflete sua consciência disso.