O poeta, contista e tradutor Paulo Henriques Britto é responsável por verter ao português livros de grandes autores de língua inglesa, como Philip Roth e Don DeLillo, e enfrentar o desafio de traduzir os complexos romances de Thomas Pynchon, como Contra o dia e Mason & Dixon – um livro escrito em inglês arcaico. Recentemente, a Companhia das Letras lançou uma edição de poemas selecionados de Elizabeth Bishop. Paulo Henriques Britto foi responsável pela seleção, tradução e pela escrita dos textos introdutórios acerca da autora. O blog do IMS preparou quatro perguntas sobre a obra da poeta, que viveu muitos anos no Brasil, e a experiência de tradução deste livro.
1) No prefácio, você corajosamente admite que deixou um poema de fora da seleção por não ter conseguido resolver satisfatoriamente um problema de tradução. Qual foi o problema?
O poema em questão termina com um verso em que Bishop traduz a fala de um personagem ao pé da letra. O que ele diz em português é prosaico: “Hoje é meu aniversário, dia de Reis” — mas na tradução literal de Bishop a frase se transforma numa coisa estranha, poética, que fecha o poema com chave de ouro. Não vejo como reproduzir o efeito em português.
2) Você acha que a visão por vezes negativa – e ocasionalmente preconceituosa – que Bishop tinha do Brasil aparece em suas poesias?
Sim, às vezes — por exemplo, em “Manuelzinho” e “Ida à padaria”.
3) No poema inédito “É maravilhoso despertar juntas…”, você transforma um verso em inglês “It is marvellous to wake up together”, que não tem marcação de gênero, em um verso que faz referência à homossexualidade da autora, um fato biográfico conhecido. Foi uma decisão tradutória difícil de tomar?
Nem tão difícil assim, porque simplesmente não há como deixar o adjetivo neutro em português. Eu teria que só utilizar adjetivos e particípios que não tivessem marca de gênero, como “alegre” e “feliz”, e ao mesmo tempo tivessem significados bem próximos aos que Bishop empregou. Não me pareceu possível fazer tal coisa.
4) O que você acha das traduções que Elizabeth Bishop fez do português ao inglês de João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de Andrade e Vinicius de Moraes?
As de Cabral não me parecem boas; as de Drummond são melhores, mas têm alguns problemas. Já a única tradução de Vinicius que ela fez é simplesmente brilhante, a meu ver.