A vida pública de Eduardo Portella (1932-2017), fruto de sua notória habilidade política, eclipsou em grande medida o fino intelectual que ele foi. Por isso é de alguma forma injusto que uma frase – “Não sou ministro. Estou ministro”, disse no último dia de seu mandato na pasta da Educação do governo Figueiredo – se sobreponha a uma longa reflexão que desenvolveu, de forma bem menos estridente, sobre literatura e pensamento crítico. Este Portella era bem conhecido de quem foi seu aluno ou por ele orientado. E, talvez sem o saber, dos que tiveram acesso a autores como Jürgen Habermas, Paul Celan ou Walter Benjamin nas traduções da Tempo Brasileiro, editora que fundou em 1962.
Em mais de vinte livros, o autor de Confluências dedicou-se principalmente ao ensaio. A forma curta e cuidadosamente inacabada servia com perfeição a seus múltiplos interesses intelectuais e, também, mostrava-se a melhor condutora da fina ironia indissociável de seus comentários, fossem eles teóricos ou mundanos. Leitor onívoro e entusiasmado, foi cultor da tradição e curioso experimentador de novidades. Em tudo e por tudo, era excelente conversa.
Em junho de 2014, recebemos Portella na sede carioca do Instituto Moreira Salles para um depoimento na série Visões da Literatura Brasileira, ainda inédita. Entrevistado por Beatriz Resende e Alberto Pucheu, colegas na Faculdade de Letras da UFRJ, ele falou livremente, ao longo de duas horas, sobre sua carreira, gostos literários e, claro, sobre política. Nos trechos selecionados abaixo, que frequentemente terminam em gargalhadas, está um Eduardo Portella reflexivo e divertido, que perdia o amigo para não perder a tirada: “Eu prefiro Paulinho da Viola a toda a Geração de 45”.