Imagino que você saiba um pouco de Macau, do Camões em Macau, do Camilo Pessanha em Macau, da arquitetura portuguesa em Macau, das casas de ópio em Macau e dos cassinos em Macau. Caminhar pela ex-colônia portuguesa na China de hoje é uma experiência desconcertante e simbólica. Cada esquina diz muito sobre a Europa e a China deste século em perpétua inauguração, sobre a passagem do tempo – e, claro, sobre Portugal, essa senhora austera que nos olha de cima, ainda que estejamos no topo da escada.
Privações produtivas
A proibição gerou poderosos frutos na história da arte. Basta observar, por exemplo, todos os livros e canções e quadros produzidos sob regimes ditatoriais. Muitos artistas reagiram virulentamente à castração de suas liberdades, criando, assim, obras de arte potentes e corajosas. Na opinião de um dos “homens hediondos” de David Foster Wallace, não apenas a privação, mas uma experiência de sofrimento extremo e traumático pode ser produtiva.
Ser aquilo com quem simpatizo
Quando comecei a escrever poemas, fazia sobretudo pastiches de Fernando Pessoa. De um heterônimo em especial: Alberto Caeiro. Eu não queria menos que isso, ser Fernando Pessoa, que escreveu entre outras declarações de despersonalização, ou de personalização pelo outro.
Tintin e a traição dos heróis
Alguns colegas críticos, admiradores de Tintin, queixaram-se de uma suposta traição de Steven Spielberg ao espírito do personagem. Apesar do evidente eurocentrismo (para não dizer colonialismo) dos quadrinhos, também sou fã. E não me senti traído por Spielberg. Penso, ao contrário, que o filme em cartaz é uma espécie de casamento perfeito: ninguém melhor que Spielberg para renovar, com os prodígios tecnológicos atuais, a saga do jovem herói criado pelo belga Hergé; e ninguém melhor que Tintin para trazer de volta o vigor criativo juvenil do cineasta.
Vida estrangeira
Concordo com isso que você falou sobre morar fora. Tenho certas dúvidas se ao final vou conseguir me entender melhor, mas é fato que as coisas ganham outro tamanho e importância. Sobre o lance da comunicação, acho que o problema é que a gente nunca é a mesma pessoa falando em língua estrangeira, e de repente você se vê flutuando entre duas versões de si, uma delas gaguejante e meio infantilizada, a outra razoavelmente madura, articulada e cheia de coisas supostamente interessantes pra compartilhar com a humanidade.
IMS participa da 3ª Mostra São Paulo de Fotografia
A partir desta quarta-feira, dia 25, o Instituto Moreira Salles participa da 3ª Mostra São Paulo de Fotografia, evento que comemora em São Paulo a data de aniversário da cidade expondo obras de diversos fotógrafos em restaurantes, bares, espaços culturais, escritórios, lojas, salões e galerias do bairro da Vila Madalena. O Instituto apresenta nesta edição fotos inéditas, pertencentes a seu acervo, do primeiro portfólio de Otto Stupakoff, precursor brasileiro de fotografia e moda.
Bonde 51
Vim parar em Bruxelas com uma trupe de teatro. Estão fazendo ações na rua. Eu os acompanho. É uma espécie de pesadelo. Fico sabendo que vão se dividir em três grupos: enquanto uma atriz oferece café e bolachas aos passageiros do bonde 51, que corta a cidade de norte a sul, duas outras se postam no meio do corredor de outro bonde da mesma linha, inamovíveis aos pedidos dos passageiros que querem passar, e um casal de atores se divide entre o bonde e as paradas, ambos enrolados, como múmias mal embalsamadas.
A primeira noite em Paris
O Old Navy segue existindo, sim, com suas bandeirinhas na fachada, balcão sujo, telões de LCD e as pessoas mais desagradáveis e menos Saint-Germain possível. Ou pelo menos existia em março ou abril do ano passado, quando passei uma temporadinha meio trágica em Paris. Eu te contei que foi o primeiro bar que entrei na minha primeira noite na cidade, totalmente por acaso? E que o García Márquez escreveu sobre o Old Navy no seu necrológio para o Cortázar?
Música e celebração
Na primeira vez que vi A música segundo Tom Jobim, o documentário de Dora Jobim (neta do homem) e Nelson Pereira dos Santos, embarquei de tal maneira no fluxo encantatório da música que não consegui prestar atenção à estrutura narrativa do filme, sua organização interna, suas estratégias de edição.
Porto Alegre anabolizada
Esse cosmopolitismo fajuto me encanta. Chego a achar que é a única forma saudável de cosmopolitismo, conceito que no mais sempre me pareceu ligeiramente bocó. Chicago é uma espécie de Porto Alegre anabolizada e com trinta graus a menos. Não tem como ser ruim. Meu réveillon foi meio furreca. Saímos com amigos queridos, mas acabamos festejando a virada num clube alemão onde uma banda tocava clássicos do rock em ritmo de polca. Falando parece divertido, mas a cerveja era quente e o clima era mais de festa de firma do que de desregramento e libertinagem.
