Filmar o êxtase

O incensado diretor canadense Xavier Dolan não ajuda. O que ele tem a dizer em entrevistas é em geral afetado, pretensioso e fútil. Entrei para ver Mommy pronto para sair no meio do filme, mas em menos de dez minutos já queria ficar para a sessão seguinte. Trata-se de uma obra-prima

 

Desafio do dia: incluir

O fotojornalista americano Dan Habib pensa em inclusão todos os dias desde que seu filho, Samuel, foi diagnosticado com paralisia cerebral. Ao longo de quatro anos, o americano produziu o documentário A inclusão de Samuel, repleto de perguntas que nos tiram da nossa zona de conforto.

A cidade como autorretrato

Na década de 1930, a cidade de Cuzco foi fotografada por Martín Chambi e Buenos Aires por Horacio Coppola. Em Chambi, a câmera projeta sobre o mundo a memória, como se o registro arcaico recobrisse a atualidade. Em Coppola, a câmara se volta para dentro de si própria, para este olhar visionário que permite antever a essência de uma cidade moderna.

Dilma, vírgula

A vírgula no slogan “Dilma, muda mais” pode ser entendida como o mecanismo que pretende virar a frase para a esquerda, argumentar a favor de pautas políticas até agora ignoradas, como o elemento de linguagem que pretende levar a presidente para lugares onde ela ainda não esteve. Quer dizer que está na hora de olhar para os aliados, o que significa olhar para as ruas, onde os protestos iniciados no ano passado pediam esse “muda mais”. 

Megaexposições, adesão e figuração

Nas duas maiores exposições em cartaz em São Paulo neste segundo semestre (a 31ª Bienal, em cartaz até 7 de dezembro, e a Feito por brasileiros, no Hospital Matarazzo, já encerrada), a arte parece anêmica. Boa parte das obras adota a linguagem dos slogans, atuando como ventríloquos de causas justas. A intenção é boa, mas o resultado é pouco menos do que constrangedor.

No espelho de Angela Davis

Assistir a Libertem Angela Davis no calor da corrida presidencial brasileira é melhor do que todo o noticiário junto. O documentário de Shola Lynch sobre o processo movido contra a ativista negra americana nos Estados Unidos dos anos 1970 mostra abundantemente o que nos falta hoje, no Brasil dos 2000: política. Não se trata de política nova ou velha, mas de política em seu sentido renovador, incômodo e polêmico.

Comédia, sonho, derrota – cada um com seu cinema

Entre os filmes mais saborosos da Mostra está Relatos selvagens, um verdadeiro fenômeno a ser estudado e discutido: o longa argentino mostra que é possível conciliar o sucesso com o respeito ao espectador. Outra comédia digna de nota é Au fil d’Ariane e sua liberdade narrativa de um sonho. Também se destacam um documentário sobre Pasolini e um curta de Manoel de Oliveira.

A mesma água que mata a sede é a que afoga

Difícil é pensar sem claque. É aí que está a possibilidade de um pensamento independente de verdade, nesse escândalo sem defensores de primeira hora, nessa irrupção sem seguidores (à esquerda e à direita), nessa coragem que é ao mesmo tempo antevisão e suicídio, ato de loucura e gesto artístico. São raros os casos de pensadores desse calibre. Pasolini era um deles.

Filmes irmãos

Libertários Chapeleiros, que o IMS agora lança em DVD, são filmes irmãos, concebidos como elementos de divulgação de pesquisa sobre as origens do movimento operário no Brasil. Complementares, valem-se de estratégias diferentes: Libertários é um filme libelo; Chapeleiros é um filme fora da norma do documentário político.