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Meu querido Dapieve:
Aproveitando sua deixa, vou manso, causos e futebol. Estou enojado com a “moral” do Ocidente, e sua representante, aquela mocreia sinistra, Hillary Clinton, que pediu “quero Kadhafi morto” 24 horas antes da óbvia execução do ditador. Também senti violenta repulsa ao ver a foto de um dos filhos dele, recostado numa parede, fumando e bebendo água, inteirinho, e pouco depois estava morto.
Você encerrou sua carta com uma engraçada história meio gay. Eu tenho um repertório ótimo, nada preconceituoso, sobre o tema. O protagonista do lance mais louco é (prefiro o tempo presente) meu saudoso amigo Fausto Wolff, um sujeito feroz se acontecesse exploração do seu nome etc. Ele estava em casa, uisquinho ao lado, escrevendo, quando tocou o telefone:
– Fausto?
– Ele.
– Oi. Aqui é a senadora Tal. Me disseram que você é um camarada progressista, boa-praça, e que poderia me ajudar em uma nobre e alegre manifestação.
– Diga.
– Vai haver uma passeata gay e eu sou meio madrinha do evento.
Fausto detestava a palavra evento…
– Sim?
– Então, eu pensei: vou solicitar ao Fausto que cite meu nome de forma sutil, e escreva uma frase assinada por ele para a abertura da passeata. Vai pintar em uma faixa enorme!
Fausto deu um golinho na birita e pediu que a parlamentar ligasse de novo em 5 minutos.
Tirrim!
– Alô?
– Fausto? Tá pronta a frase?
– Claro! Anota aí.
– Manda!
– De leve, como você pediu.
– Ótimo! Lá vai: DEIXEM DE SER VIADOS E VOTEM NA SENADORA TAL!
Fausto Wolff
Segundo causo:
Um grande amigo meu, gay convicto e gozador, sugeriu que fôssemos os dois a São Paulo para entrevistar uma grande figura, meio maldita. Ele tinha certeza de que seria uma bomba. Convidamos o Mello Menezes – que também é garantia de confusão – para fotografar, já que íamos no escuro, sem pagamento. Mello topou, e partimos os três, de ônibus, bebendo vodca. Antes da entrevista, marcada para 22 horas, Mello sugeriu mais drinques num barzinho “muito bom de mulheres”. De fato. Lá pelas tantas (e meu amigo gay era, de longe, o mais bonito dos três), umas moças um tanto atiradas mandaram um torpedo. Mello, sempre cavalheiresco, convidou-as para nossa mesa. A distribuição dos casais se fez naturalmente pela simpatia mútua. Eu, conhecendo os dois, era o mais inquieto, esperando encrenca. Foi quando a partner do amigo gay miou:
– Você tem uns olhos de baratinar, mas ainda não me disse seu nome.
E meu amigo, com um sorriso devastador:
– Valéria!
Mello e eu caímos na gargalhada, e as jovens foram embora, resmungando:
– Que fria! Três boiolas. Não davam a menor pinta…
Bom, vamos ao meu valium 10 (menos quando joga o Vasco), o futebol. Sou um torcedor heterodoxo, supercrítico. Meu pai me levou desde pequeno ao Maracanã. Comprou uma bandeirinha do Vasco pra mim. Era minúscula, em formato de flâmula. Embora as arquibancadas fossem em degraus, toda vez que eu ameaçava levantar a bandeira, ele cortava:
– Abaixa isso pra não atrapalhar a visão de quem está atrás.
Pra que dar uma bandeira a um garoto se ele não pode balançá-la? O melhor está por vir: bola pra Sabará na direita, dribla seu marcador, cruza pra Vavá na entrada da área, Vavá domina o balão de couro, chuta com violência e GOOOLLL! Quando eu ia levantando pra comemorar o tento, olhei pro meu pai, sentado, fumando furiosamente, muito irritado, de pernas cruzadas. Tive vontade de bater com a bandeira na cabeça dele:
– Foi gol!
Meu pai:
– Besteira! O Pinga estava solto na esquerda. Vavá foi fominha.
Quanto ao momento atual, não me impressiona o Vasco ser líder (quando escrevo). Trata-se de futebol de campo, e não de salão. O Vasco tem 5 jogadores: o goleiro, o zagueiro da seleção, e três ótimos meio-campistas. Alguém pode lembrar o denodo de Éder Luís, que sua a camisa, mas, se fazer força ganhasse jogo, minha lendária prisão de ventre me alçaria a titular dos Canarinhos.
Conforme você já percebeu, a herança paterna calou fundo.
Abraço fraterno,
Aldir
* Na imagem da home que ilustra este post: o jogador Pinga, que defendeu o Vasco entre 1953 e 1961