Realismo e desejo

Assisti à montagem de Ivánov, de Tchekhov, dirigida por Luc Bondy, em Paris. A encenação era irregular, mas alguma coisa no texto me fez perder o pé. Tinha a ver com o amor e o desejo. A grandeza do realismo de Tchekhov vem da capacidade de fazer o mundo falar pelas suas complexidades, por ambiguidades e contradições. A compreensão do realismo literário hoje, ao contrário, foi reduzida a um modelo sucateado, a serviço de uma estratégia de identificação, com claros objetivos comerciais.

Nazareth para dois pianos

O IMS sempre celebra o aniversário de Ernesto Nazareth, cujo acervo se encontra no instituto e que tem sua vida e sua obra esmiuçadas em um site especial. O recital “Ernesto Nazareth: 150 + 2: Os arranjos de Radamés Gnattali” foi realizado em 26 de março, no IMS-RJ, pelos pianistas Alexandre Dias e Maria Teresa Madeira. Disponibilizamos os vídeos de todas as músicas interpretadas naquela noite.

O artista e seu modelo

Um tema constante na obra de Picasso, espécie de reflexão sobre o processo criativo formulada em séries de desenhos, gravuras e pinturas – O artista e seu modelo –, talvez seja o verdadeiro assunto das Últimas conversas filmadas por Eduardo Coutinho: a busca da possível (ou impossível?) realização de uma imagem capaz de retratar o modelo e também o artista.

Coutinho e a poética do encontro

Eduardo Coutinho, morto de forma trágica há pouco mais de um ano, não terminou de dizer o que tinha a dizer. Suas últimas palavras estão em Últimas conversas, concebido para ser um diálogo com múltiplos rapazes e moças no final da adolescência. Coutinho conseguiu o milagre de furar o bloqueio de jovens que chegam diante da câmera maquiados, preparados.

Profissão, professor, profanação

Quando o saber ainda não era mera circulação de mercadoria, a profissão de professor era consagrada. Como figura encarnada do sabedor, o professor, a quem cabia promover a formação, cai da consagração para a profanação. Apanhar da PM nas ruas de Curitiba, fazer greves invisíveis e exercer uma profissão cujo piso salarial na rede pública é de R$ 1.917,78 – valor de 2015, considerado um imenso avanço em relação aos anos anteriores – é parte dessa imensa história de profanação.

Dólares, areia, Geraldine e Abujamra

Dólares de areia é um corpo estranho no aviltado circuito exibidor brasileiro. Dirigido pelo mexicano Israel Cárdenas e pela dominicana Laura Amelia Guzmán, é uma coprodução entre os dois países e trata justamente de trocas e entrechoques culturais, sociais, geracionais. No fundo, é também um filme sobre corpos estranhos: estranhos uns aos outros e estranhos a um público habituado ao padrão biotípico hollywoodiano.

Antropologia de si

Karl Ove Knausgaard, consagrado mundo afora como o “novo Proust”, narra a própria vida e sua relação com o pai violento e alcoólatra em Minha luta. Em meados do século passado, outro escritor também se propôs a criar uma obra a partir da descrição radical de si mesmo, mas com resultados opostos. Michel Leiris publicou A idade viril em 1939, e a radicalidade vinha do avesso de um processo de identificação imediata com o leitor.

O que há de novo no Cinema Novo?

Começa na próxima quarta-feira (29 de abril) na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, uma grande retrospectiva do Cinema Novo. É uma boa oportunidade para separar o trigo do joio e fazer uma avaliação mais equilibrada da real importância dessa produção nada uniforme. Alguns filmes envelheceram mal, outros – como Os cafajestesO padre e a moçaTerra em transe São Bernardo – seguem vivos, dolorosos, cortantes.

Pixinguinha em concerto

Neste 23 de abril, data do aniversário de Pixinguinha, o Blog do IMS apresenta vídeos de músicas interpretadas pela Orquestra Pixinguinha na Pauta em setembro de 2014, no Teatro João Caetano, no Rio. A primeira delas é “Carinhoso”. Filmado em alta definição pela equipe de Marcelo de Macedo Noronha, o concerto reuniu arranjos escritos pelo maestro e cujas partituras o IMS vem publicando em livros.

Você tem medo de quê?

Há algo na experiência contemporânea em relação à multiplicação de discursos – de ódio, de pânico moral, de violências – que é impossível compreender. O espetáculo O que você realmente está fazendo é esperar o acidente acontecer, da Cia de Teatro Acidental, é uma excelente provocação sobre o que significam estas disputas de discurso, performatizando um dos temas em pauta nas redes sociais: homofobia, violência e discriminação sexual.