Recebi um convite para uma reunião da turma da escola, 40 anos de conclusão do segundo grau. Penso nesses 40 anos quando vejo em torno de mim todas as homenagens aos 50 anos de Maio de 1968, seu espírito revolucionário, suas promessas de futuro que ainda estão aí, ora nos assombrando como fantasmas, ora nos animando a ir às ruas de novo e mais uma vez. Há debates, livros, seminários, e há sobretudo o fato de que, se na França ou na Alemanha 1968 é um marco em direção a um novo futuro, no Brasil é o ano do assassinato, pela polícia, do estudante Edson Luís, da Passeata dos Cem Mil e da decretação do AI-5.
A luz vem da Ásia
Chegam do Oriente dois filmes que, cada um a seu modo, exploram a natureza da imagem, seus sentidos, seus efeitos: o japonês Esplendor, de Naomi Kawase (destaque), e o coreano A câmera de Claire, de Hong Sang-soo.
O lugar de Luan
Acho difícil entender a birra de Tite por Luan, o jovem, móvel e objetivo atacante do Grêmio. Todo mundo tem lá suas manias, vai. Se é verdade que o Brasil tem 207 milhões de técnicos de futebol, há 207 milhões de manias latentes às vésperas da convocação da seleção para a Copa da Rússia. A mania que conta, claro, é a do Tite. E, a meu ver, ele está exagerando.
Infância selvagem
O que impede Ciganos da Ciambra de ser apenas um vívido registro naturalista de uma comunidade pobre é a dimensão moral, trágica, que adquire a trajetória de Pio. É, em essência, um romance de formação, ou antes de deformação. O filme de Jonas Carpignano é uma volta às origens do cinema italiano, a mostrar que este não se diluiu no sentimentalismo de um Tornatore nem na afetação de um Sorrentino.
Sororidad
Por um balaio de motivos, dos práticos aos patológicos, escrevo ficção muito devagar. Essa lentidão acabou transformando o que seria meu novo romance em um livro com três narrativas independentes. A primeira se chama Sororidad e narra as histórias entrecruzadas de uma mulher com disforia de espécie – nasceu humana, mas se identifica como cabra – e de um grupo de argentinas que, ao serem abandonadas nas estradas do Rio Grande do Sul, se unem para criar uma comunidade rural isolada do resto do mundo.
Corpos fora do lugar
Filmes que abolem a fronteira entre o documentário e a ficção se tornaram nos últimos tempos quase um gênero à parte. Dois novos títulos brasileiros exploram esse território ambíguo, abordando, cada um à sua maneira, temas pungentes e atuais: o documentário com aspectos ficcionais Ex-pajé, de Luiz Bolognesi, e a ficção com aspectos documentais Cidade do futuro, de Cláudio Marques e Marília Hughes.
Negativo
Primeira vista traz prosa ou poesia inédita, criada a partir de fotografias selecionadas no acervo do IMS. O autor escreve sem ter informação nenhuma sobre a imagem, contando apenas com o estímulo visual. Neste mês, Débora Ferraz escreve sobre uma foto de Hildegard Rosenthal, tirada em São Paulo por volta de 1940.
Mergulho no raso
Submersão, novo filme de Wim Wenders, não é ruim, embora desprovido da inquietação autoral e do grão de estranheza que caracterizavam seu melhor cinema. Já O terceiro assassinato transporta o japonês Hirokazu Kore-eda a um novo patamar.
Mulheres, sem espanto ou desdém
Projetos e ações que incentivam a leitura de literatura produzida por mulheres têm sido onipresentes. Alguns pontos, no entanto, podem ser ajustados. Partindo de uma leitura de Siri Hustvedt, Camila von Holdefer discute o que ainda precisa ser feito.
Pesadelos contemporâneos
Não é toda semana que entram em cartaz novos filmes de três grandes autores em plena forma, como está acontecendo bem agora, com Roman Polanski (Baseado em fatos reais), Hong Sang-soo (O dia depois) e Kiyoshi Kurosawa (Antes que tudo desapareça). Cada um com sua poética pessoal e intransferível, eles ajudam a iluminar o desconcerto do indivíduo dentro de um mundo enlouquecido e esfacelado.